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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

06/12/2025 25.35 ºC, São Paulo

As unhas (afiadas) de Dercy

As longas unhas pintadas com esmalte verde coberto de purpurina cintilam sem parar. Apesar da bengala – toda estampada – que usa para se apoiar, Dercy Gonçalves, 98 anos, gesticula o tempo todo, deixando claro: “não vou fazer show em São Paulo nem em lugar nenhum!” E arremata: “sou uma mulher que não devia sair de casa. Deus virou pra mim e disse: eu te dou 98 anos, mas não abuse.” Cheia de lantejoulas da cabeça aos pés – dos brincos e anéis aos tênis de sola baixa – a dama da comédia nacional desmentiu o boato de que faria uma temporada de apresentações no Bar Brahma, onde foi realizada uma entrevista coletiva. Entre chopes, porções de pastéis e algumas bordoadas verbais, a atriz falou sobre as primeiras tomadas de “Dercy de Cabo a Rabo”, documentário com direção de Ivo Branco que está em fase de captação de imagens e depoimentos. “Minha vontade é mostrar o porquê de ter vivido tanto. Por que passei de uma cantora de igreja para a pornografia? Porque fui uma burra, inocente, sem pai nem mãe. O Brasil não tem uma mulher que inventa!” (Neste momento, o garçom derruba uma bandeja enquanto tanta descer as escadas estreitas do Brahminha.) “Isso é uma ovação?”, ironizou, rodeada por repórteres de programas vespertinos da TV aberta. Ágil no corpo-a-corpo com os jornalistas – saiu ilesa do bombardeio de perguntas infames – e nas manobras radicais – ela foi capaz de levantar a perna formando um ângulo de 90 graus com a cadeira –, nem a falta de cílios postiços fez diferença. “Como assim quem escolheu a minha roupa? Eu comprei com o meu dinheiro, porra! Porque é brilhante, é bonita, e eu tô com o corpinho bom!” “O que é o amor para você?”, alguém arrisca. “O amor não existe. Nunca amei ninguém porque não tive tempo hábil.” Outra: “Qual é a melhor palavra do dicionário?” Resposta: “Eu não sei o que é dicionário!” Mas, naquela noite, segundo Ivo, Dercy não estava se sentindo muito bem. “Ela comeu um pouco demais...” E a resposta veio rápida: “Eu faço a minha comida, não como a dos outros. Gosto de pimenta malagueta, do reino; como mocotó, arroz, feijão, bacalhau. Hoje comi como uma vaca, alguma coisa me fez mal.” (Neste ponto, o empresário da atriz pede para o câmera desligar o equipamento: “O Sílvio disse que eram só três minutos com as televisões!”) E a réplica veio como um raio: “O Sílvio não me dá quatro minutos, vamos aproveitar os três dos outros!”(02/05/2005) * Reportagem originalmente publicada no Jornal da Tarde

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