Balada-surpresa

Por Mariana Della Barba
O convite chegou por email. Saltou aos olhos de imediato. O lançamento de um filme no Centro. Uma festa no Mercadão. Imperdível. Na minha cabeça, certamente a balada aconteceria no recém-inaugurado mezanino. Entre um canapé e outro, uma olhadinha pra baixo, ver o mar de frutas de cima.
Ao chegar lá, duh, acordei do sonho. Nada de mezanino, a festa rolava em um anexo para eventos do Mercadão. Nada de visual diferente, cheiro de frutas... O lugar, abarrotado de gente, mais parecia uma casa noturna da Vila Olímpia. Heresia pouca é bobagem.
Antes das doze badaladas, a balada já era considerada o mico do ano. Surge a idéia de ir embora, inevitável. Mas era preciso fazer valer os reais gastos no estacionamento. Como? Uma voltinha pelos corredores do nosso querido Mercado. E eis que a idéia iluminada faz valer a noite. Descobrimos na madruga do Mercadão a mais deliciosa das baladas improváveis.
A descoberta: algumas lanchonetes funcionam 24 horas. A noite não estava perdida. Debaixo do teto restaurado, banquetinhas convidativas no Tigrão. Espaço. Nada do empurra-empurra da tal festa. Anderson trouxe os copos e a cerveja. Gelada, claro. Anotou ou pedido, sanduíche de mortadela. E haja recheio. Economia, só nas bandejas dos garçons moderninhos que (pouco) circulavam no “anexo”.
Nariz empinado também não tem vez na lanchonete Tigrão. Fica restrito à área de eventos. Anderson conversa enquanto lava os copos. “Entro às 10h da noite e saio às 7h da manhã. Gosto muito de trabalhar aqui.” Por quê? “Ah, antes cuidava de uma banca de jornal lá perto de onde eu moro, em São Miguel, mas aqui é melhor, sempre conheço gente nova.”
Mas há quanto tempo você trabalha no Mercado? “Ah, faz uns três ou quatro meses só, mas todo mundo se conhece aqui, criamos muita amizade.” E passam mais carregadores. Laranjas, melancias, abacaxis. E caixas tão rápidas que mal dá tempo de identificar a cor da fruta.
“Vai outra cerveja aí?”, pergunta Anderson entre uma passadinha de pano e outra. Vai, óbvio. A cerveja é a bebida de maior saída no Tigrão. A comida? “Hum, o pastel de... não, não, é a calabresa na chapa”, diz já correndo para atender outro cliente refugiado do evento vexaminoso. Ele não pára. O Mercado também não.
Abridor em punho, Anderson confessa: “Trabalhar à noite é mais tranqüilo, vêm mais os feireiros. A não ser quando tem festa, e tá tendo festa direto aqui...”, ri Anderson, sem perder o bom humor.
Anota aí: o Mercadão preenche as noites de insônia. Diverte o pós-balada e cura alergias a olímpias, madalenas e jardins. (10/11/2004)