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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

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Experiência portenha

por Renata V. Mesquita* Muitos vôos diários desembarcam atualmente uma batelada de brasileiros em Buenos Aires. A turismo ou a trabalho, todos acabam visitando Porto Madero e ficam encantados com o charme do lugar. Mas poucos imaginam que até finais dos anos 80 era impraticável caminhar por ali, as docas estavam totalmente degradadas e seus únicos habitantes eram as ratazanas.

Construído de 1861 a 1882, seguindo os traçados de Eduardo Madero (daí o nome), colocado em prática pelo engenheiro Luis A. Huergo, o Porto Madero foi a porta de entrada mais promissora do comércio internacional argentino. Mas, dez anos depois, perdeu sua força para outros portos que ofereciam acesso mais fácil para as embarcações e começou a decair. Por alguns vários anos, durante a ditadura, suas instalações serviram para fins militares. De volta a democracia, foram diversas as tentativas - sem êxito - de recuperação da área: em 1940, 1962, 1969 e 1971, afinal Porto Madero está ao lado da Casa Rosada e sua aparência afeta também a imagem do governo. Além do que, os portos sempre representaram a identidade da capital nacional, não por acaso as pessoas que vivem ali são conhecidas por "portenhos", embora portenho signifique qualquer morador de cidade portuária, não é comum utilizar o mesmo termo para determinar moradores de outras partes da Argentina. Em 1989, o então presidente Carlos Menem tomou uma iniciativa que tinha como determinação dar certo - uma das poucas heranças positivas que deixou para a economia da cidade e, por que não, também do país. O plano envolveu a administração da cidade de Buenos Aires, o governo federal e investidores privados locais e internacionais. A empresa La Corporación Antiguo Puerto Madero S.A., que administrou toda a transformação da área e controlou a venda dos terrenos, foi criada por Menem para se afastar da imagem de uma instituição governamental, geralmente associada à lentidão e ineficiência. O projeto também contou, obviamente, com a participação de arquitetos. Um capítulo bastante truncado dessa história. O projeto inicial - que havia sido desenvolvido por uma equipe restrita de arquitetos espanhóis e argentinos - foi contestado pela comunidade nacional de profissionais da área e acabou sendo praticamente substituído por idéias selecionadas por um concurso nacional. A composição dos tijolos à vista e vigas de ferros fundidos a partir daí ganharam materiais modernos sem perder ou agredir seu estilo. E recebeu restaurantes, cinemas, lojas e empresas variadas, uma universidade equivalente à nossa PUC, assim como reservou os pisos superiores para moradias de alto padrão. E não só os galpões do entorno dos diques foram recuperados, ao todo 170 hectares foram repensados urbanisticamente. Ali ao lado, entre o Rio da Prata e Porto Madero, criou-se uma grande Reserva Ecológica, também delimitaram-se zonas residencial e comercial e aí se levantaram muitos prédios bastante modernos. Ou seja, criou-se um novo bairro que permitiu à cidade se expandir para o sentido oposto que vinha percorrendo há muitas décadas e detalhe: bem junto ao Centro. A iniciativa que nasceu desacreditada pela população que já tinha visto várias outras falindo se tornou assim o exemplo mais bem-sucedidos de revitalização de uma área urbana na América Latina. Experiência que deve servir de inspiração para tantos paulistanos que voltam da Argentina falando maravilhas de Buenos Aires e Porto Madero, mas não acreditam na recuperação do Centro da sua própria cidade, que é a maior cidade do Brasil. (24/10/2004) *Esta integrante do Sampacentro esteve por três meses experimentando a vida na cidade de Buenos Aires. Y se puede decir que a ella le encantó!

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