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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

06/12/2025 24.02 ºC, São Paulo

Impresso na carne

Cinco da tarde. Rodrigo de Sousa, 19 anos, se esforça para não fazer muitas caretas ao finalizar sua 12ª tatuagem, resultado de mais de dez horas de trabalho divididas entre o sábado e o domingo. Enquanto isso, aproveita para sonhar com o próximo desenho: “vou tatuar o rosto de minha avó na coxa direita”, planeja. Um tom de vermelho intenso vai tingindo seu ombro e parte do braço esquerdo enquanto conversamos no estande da Ultimate Machine, um dos mais de 40 participantes da Convenção de Tatuagem que reuniu centenas de adeptos na rua da Consolação, a alguns passos da Praça Roosevelt. Apaixonado por desenho, o garoto mostra o duende que estampa seu ombro direito – o primeiro deles, feito há dois anos. De lá para cá, ele conta que teve de superar muitos obstáculos, pois acabou descobrindo na tatuagem um vício incorrigível. “Namorei uma menina que pegava muito no meu pé por causa disso”, comenta. “Mesmo assim, nunca pensei em parar de me rabiscar e de criar desenhos.” O resultado não é difícil de imaginar: Rodrigo terminou o namoro e deu continuidade ao relacionamento com as tintas. Se deu bem. Fabinho, seu tatuador, foi quem o ensinou as técnicas. Alguns toques mais tarde, os amigos se tornaram cobaias. Daí para a própria família foi um pulinho, ou melhor, algumas agulhadas. “Desde que comecei, já tatuei outras pessoas umas 20 vezes”, calcula. Eram todos amigos. Depois vieram o padrasto, o irmão e – pasme – a mãe. “Ela me viu tatuando uma garota, entendeu que não era um bicho de sete cabeças e se animou. Resolveu fazer uma flor de lótus no ombro.” Há duas semanas, Rodrigo comemorou o primeiro emprego na área: tatuador no estúdio onde Fabinho trabalha. A maioria dos estúdios negocia o valor da tatuagem com base no tamanho do desenho ou, se ele for muito grande, no tempo que vai levar para ficar pronto. No caso do Ultimate Machine, a hora sai por R$ 80. Para Fabinho, esse misto de prazer e dor vale a pena quando se vê o resultado. “É a maior alegria ver um trampo bem feito”, sorri. “Mas, para ser tatuador, tem de saber desenhar e gostar realmente da profissão, porque, se for pelo dinheiro, não dá certo.” E o preconceito? “Apesar de sermos profissionais, sofremos muito com a discriminação, quase todos os dias”, diz Fabinho. “Tem gente que atravessa a rua quando me vê... outros não arriscam sentar do meu lado em um ônibus”, desabafa. Mas, aqui, o clima é outro. Além de dar pinta com o braço desenhado, há a chance de concorrer a um troféu oferecido pela organização e, ainda, sair nas revistas que tratam do assunto. O motivo oriental inspirado no desenho de um artista japonês vai ficando cada vez mais colorido. “Acabamos de criar esse tom”, diz Rodrigo. Pergunto mais uma vez: e a dor? “Com o tempo, o braço incha e acaba ficando anestesiado”, diz o garoto. “Ontem, durante a sessão, até dormi.” (18/04/2004) Serviço:
Ultimate Machine
Praça Dom José de Barros, 51, 3° andar, cj. 32
Tel.: 3255-6049

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