Concurso Sampacentro - O arco-íris e a testemunha
Por Fátima Terça-feira - 17h40 - horário de verão, ano: faz tempo. Sigo pela Avenida São Luís em direção à Praça da República, espero o sinal fechar e atravesso a rua acompanhando um contingente variado: brancos, pardos, negros, sul-americanos, europeus, afro-descendentes, brasileiros de todos as regiões... Meu destino? Atingir o Largo do Arouche - e uma grande loja de tecidos, continuo caminhando, por trás do prédio Caetano de Campos, olho a esquerda; Rua Araújo, mais a frente, Marquês de Itu, volto meus olhos para a direita e vejo os prédios cinza-escuro da Avenida São João e sobre eles uma tiara, uma coroa, um arco... Colorido... Não, um arco-íris! Continuo andando - porém, meus pés já não olham por onde pisam, ultrapassam buracos, desníveis, sujeiras, chicletes persistentes, pontas de cigarros, lixos rolados pelo vento. Meus olhos, meus pensamentos, minha expressão estão presos naquele arco delicado e destoante. Até que acordo, olho em volta: moradores/transeuntes da cidade caminham próximo a mim, atravessam, cruzam, empurram-se, procuram se desencontrar e... ninguém vê o que vejo, ou até vê, mas não percebe. Tenho vontade de me colocar à frente de cada um e dizer: “Sim, no Centro poluído, cinza, sujo, violento, amargo, pesado e trabalhador, por entre crianças maltrapilhas e mal amadas, no final de um dia de trabalho, no final de uma clara tarde de verão também pode aparecer um arco-íris”. Que nada! As pessoas continuam na sua marcha, nos seus pensamentos. Continuo caminhando, chego à Rua do Arouche, atinjo o Largo. passam-se 20 anos, continuo com a impressão de ter sido a única testemunha daquela presença. O que poderia ter feito? Chacoalhado os ombros e os olhos de cada um? Quem sabe um dia outros transeuntes nesses mesmos caminhos centrais de São Paulo se aventurem a olhar em volta, olhar para o céu, olhar para os outros e, quem sabe, encontrar o exato momento do seu arco-íris.