O poeta engraxate
Ele é engraxate há mais tempo que autor de livro. Mas não se pode falar que ele é engraxate há mais tempo que poeta. Afinal, o talento já nasce com a pessoa só que às vezes leva um tempo para vir à tona ou para poder ser publicado em livro. Seu Geraldo Esmeraldo tem 70 anos, desde que veio para São Paulo, há 47 anos, trabalha como engraxate no Largo São Bento e há cerca de quatro anos publicou - com dinheiro do próprio bolso - a primeira edição do seu livro de poemas. Ele já está na segunda edição.

E olha que seu Geraldo só estudou até a quarta série do primário. "Sou um poeta meio analfabeto. Mas sempre li muito", conta. De fato, um errinho de ortografia aqui ou ali e "ainda o moço que não ajuda e digita o texto errado", completa ele. Mas a qualidade e a sonoridade dos versos não são perdidas e muito menos deixam a desejar. Ainda mais quando ele, de surpresa, anuncia que vai declamar um versinho ali na hora para você. Como aconteceu durante a nossa conversa. Encantador! A rima vai do começo ao fim e o conteúdo é de impressionar. "Tem um professor que fala que quando eu termino de recitar meus poemas ele quase pode ver a história que eu contei." E é assim mesmo.
Não é à toa que seu Geraldo já está na segunda edição do livro - dois mil exemplares publicados. Assim como não é à toa que ele já virou assunto para entrevista no Jô Soares, na Ana Maria Braga e na Xuxa, além de matéria do jornal O Estado de S. Paulo. É seu Geraldo mesmo que vende para os fregueses e para pessoas que vão até ele indicados por quem conhece sua poesia. "Freguês não. Não tenho freguês. São todos minha família. São a parte rica da família que vem aqui me ajudar", brinca. Aliás, seu Geraldo está sempre se divertindo e divertindo os outros. Jorge Teixeira, que sempre aparece ali para engraxar os sapatos - e para bater um bom papo, lógico - confirma. "Aqui a gente também conversa de tudo. Ontem, que eu também vim aqui, nós conversamos sobre a situação do país e a situação universal", fala sorrindo. "E resolvemos os problemas aqui mesmo", emenda seu Geraldo, brincando.
Também é assim pra falar da sua cidade-natal, São Bento do Sapucaí, interior do Estado de São Paulo a 2 km da divisa com Minas Gerais, onde viveu até os 10 anos, quando mudou com a família para Lambari (MG) para trabalhar na roça. "São Bento é tão pequena que quando a traseira do ônibus está entrando a frente já está saindo."
O alto astral e a energia são marcas registradas do seu Geraldo. Mesmo hoje, com 70 anos, ele caminha todo dia da sua casa, na avenida da Consolação, até o Largo São Bento. "Levo 20 minutos porque ando rápido." E ali se sente muito bem. Devoto de São Bento, desde muito criança - por influência da avó -, não podia estar em lugar melhor: em frente à igreja onde assiste missa todo dia. "Eu sou feliz", diz com a boca cheia.