O Príncipe

"Tem certeza de que esta é a rua Morato Coelho?", pergunta Gustavo (Eduardo Tornaghi) ao taxista, no momento em que chega ao bairro de Pinheiros depois de ter passado 20 anos morando em Paris.
Ao contrário do ritmo da cidade de caos que Ugo Giorgetti quer mostrar em seu novo filme, "O Príncipe", a história caminha a passos lentos, como quem estranha os lugares por onde passa. Da região central à Cidade Jardim, nenhuma rua está imune à degeneração.
É nesse cenário que a "grande intelectualidade artístico-cultural brasileira" -- conforme definição do personagem Marino Esteves (Éwerton de Castro) -- os intelectuais descolados de São Paulo praticam malhação na Companhia Atlética e passeiam por São Paulo em carros importados, entre um coquetel e outro para promover uma multinacional "X". O Marketing Cultural virou meio de vida de professores e outros profissionais humanistas, que agora fazem as vezes de "promoter". Enquanto isso, quem não aderiu à nova onda vive nos fundos de uma fábrica no Bom Retiro, dando aulas de xadrez e cozinhando como voluntário em um albergue para moradores de rua. Ou, então, se suicida.
Oscilando entre um extremo e outro, Gustavo, personagem principal da trama, aproveita para rever os amigos e vagar por São Paulo em busca de lugares que agora só existem no mundo das lembranças. Certa noite, depois de um jantar no Paddock (restaurante que fechou suas portas depois das filmagens), ele e um amigo (interpretado por Otávio Augusto) saem pelo Centro em busca da boemia perdida. Fazem ode a Paulo Vanzolini e Chico Buarque, relembram a "brilhante galeria, cheia de luz e de música" -- a famosa Metrópole -- e deságuam na Praça Dom José Gaspar, povoada por moradores de rua. Ou eram apenas algumas sombras?
Não seria o "desabamento central da alma" -- definição dada pelo professor Mário (Ricardo Blat), internado em uma clínica psiquiátrica, a respeito de sua doença -- o diagnóstico da situação social e cultural no Brasil? "O Príncipe" ficou em R$ 1,6 milhão. Empresas como Nossa Caixa, BNDS e W/Brasil foram os maiores investidores, mas Unibanco, Eletrobrás, Santander/Banespa e Indiana Seguros também deram contribuições valiosas.
Além de criar espaços culturais -- papel importante de muitas empresas no Centro -- é importante também que se pense em informar e educar. Pensar menos em números é um passo essencial para a humanização do Centro. Quem sabe, dessa maneira, o significado de "cultura" deixe de ser "colunismo social". (08/08/02)