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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

06/12/2025 25.35 ºC, São Paulo

Olha o rapa!

Por Lígia Nogueira Nos anos 70, seguindo a perspectiva da valorização das atividades no Centro, dois quilômetros de calçadão foram inaugurados. Essas vias pedestrianizadas -- para usar o termo técnico -- surgiram, a princípio, como uma solução para os conflitos entre veículos e pedestres da região das ruas do triângulo. Tudo parecia ir bem: bares instalavam suas mesinhas na calçada e as crianças brincavam nos horários de menor movimento. No entanto, o cenário foi aos poucos tomando outro formato. Essas vias foram se expandindo, o que formou uma malha de calçadões pelo Centro. E o que era para facilitar, acabou dificultando o acesso a diversos bancos, lojas, cinemas e restaurantes. Ir ao Centro de carro tornou-se uma tarefa difícil. E, ao mesmo tempo, os que estão a pé correm o risco de ter de desviar dos carros de transporte de valores e viaturas policiais que precisam passar. Com o tempo, certas ruas ficaram conhecidas por seu "serviço" de camelôs, como é o caso da rua São Bento. Aos poucos, acabamos até incorporando esses trabalhadores a nossas incursões ao Centro -- como se aquelas barraquinhas já fizessem parte da paisagem. Aprendemos a compreender a situação. Treinamos os nossos olhares para alcançar a mais escondida fachada, algumas remanescências de outras épocas. Mas tem uma hora em que tudo pára. Todas as atenções, então, se voltam para um só lugar: o carro do rapa. Por causa dele, outro dia, presenciei um espetáculo tragicômico de tábuas se erguendo e se movimentando, e em apenas alguns segundos toda a sorte de objetos desaparecendo da rua São Bento, como se um furacão mandasse tudo pelos ares. "Olha o rapa!!" -- o grito de um camelô ecoava. E assim, por toda a extensão da rua, o grito me acompanhava, e as barracas ao meu redor iam sumindo, uma a uma. Num misto de curiosidade e perplexidade, consegui apenas abrir caminho para que os camelôs retirassem suas coisas e as levassem embora. Não consegui nem tirar uma foto. De registro, fica apenas o grito. (05/05/2002)

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