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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

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Oceano de repressão

No final de abril, a professora Maria Aparecida de Aquino vai concluir um projeto de quatro anos: o mapeamento e a sistematização da “Série Dossiês (1940-1983)” do Arquivo do Estado, com catalogação, restauro e levantamento de todo o material e financiamento da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo). Não é pouca coisa: ao todo são 1,1 milhão de fichas que remetem a 2 milhões de documentos espalhados por 9.626 pastas.

“Tivemos contato com o primeiro papel em 28 de fevereiro de 1998. Dois anos depois, fizemos nossa primeira prestação de contas e conseguimos prorrogar a pesquisa por mais dois anos”, conta a doutora em história social. “Criamos um banco de dados único. Agora estamos ajustando a cara final dele para entregá-lo à comunidade.” O projeto custou por volta de R$ 300 mil, dois terços para a compra de equipamento e material para desenvolvimento e manutenção do estudo. “Primeiro abrimos pasta por pasta, depois criamos as fichas descritivas de cada documento para podermos entender os assuntos tratados e só então conseguimos decifrar os códigos”, continua. A professora da USP, que pesquisa os regimes militares desde 1986, explica que o início do levantamento foi a fase mais difícil: “O nosso maior medo era que aquela avalanche de material nos comesse, nos engolisse e não conseguíssemos fazer nada. Então desenvolvemos uma metodologia específica e estabelecemos metas e prazos rígidos para tudo. Houve momentos de frustração, de um desespero de arrancar os cabelos, mas acho que fomos bem-sucedidos”. “Além disso, tivemos de nos lançar na conservação do material e quisemos fazer uma investida no arquivo de microfilme. Só havia 10% de documentação e chegamos a 50%. O processo é lento realmente, mas acho que conseguimos dar um bom pontapé para a finalização dele”, afirma Maria Aparecida. Do oceano de informações do arquivo, a doutora aponta: “Uma coisa que fica claro é que o acervo não é só de um aparelho de repressão, mas também de organizações clandestinas cujos arquivos não foram preservados. É a história da resistência e da repressão convivendo lado a lado”. Quem sabe até na mesma gaveta. A parte mais saborosa realmente deve estar no relatório dos arapongas do serviço secreto de informações. “Eles vigiavam as pessoas, com muito afinco, até no lado pessoal. Com isso, o agente acaba tendo de se mostrar também”, conta. Foram 40 anos de censura pesquisados. Nenhum vestígio de tortura aplicada. “O Dops sempre esteve forte e ativo. Mesmo durante governos considerados democráticos, nunca parou de produzir documentação - às vezes, sem nenhum sentido, porque considerava desde o princípio qualquer cidadão como um suspeito em potencial”, afirma a pesquisadora. “O Dops de São Paulo foi o órgão mais poderoso durante o regime militar. Contudo as ações ilegais não vão para os documentos. É só lembrar o delegado Sérgio Fleury, que competia com as outras instituições nesse quesito. Mas nunca a tortura foi admitida, seria como colocar a cabeça a prêmio.” Em setembro deste ano serão lançados mais quatro volumes com o restante das fichas descritivas e um assunto analisado em profundidade por um mestre ou mestrando de história. Os temas são o Serviço Nacional de Informações, o Segundo Exército, os agentes infiltrados e a figura política de Adhemar de Barros. (26/04/2002) No Coração das Trevas: O Deops/SP Visto por Dentro
Organização: Maria Aparecida de Aquino, Marco Aurélio Vannucchi Leme de Mattos e Walter Cruz Swensson Jr.
Editora: Arquivo do Estado/Imprensa Oficial, 2001
Preço: R$ 15 (208 págs.)

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