Estados de olhar
O prédio do CCBB se transformou em uma grande instalação. Pela primeira vez desde que o espaço foi reinaugurado como centro cultural, uma mulher expõe suas obras. A autora da proeza: a escultora Laura Vinci. “Foi uma delicadeza do Marcello [Dantas, curador da programação de artes visuais] ter me convidado. Ainda mais sendo março o mês da mulher”, conta a artista paulista de 40 anos, 13 deles montando exposições individuais.

A artista começou no ramo da pintura, mas acabou enveredando por novos caminhos. “A escultura me conquistou. Já usei de tudo: mármore, gesso, vidro e mesmo vídeo...”
Aliás, esse é um dos aspectos mais desenvolvidos na mostra “Estados”: as transformações. “Exploro diferentes estados de matérias --sólido, líquido e gasoso--, a coisa vai se transformando. Mas o que eu quero realmente fazer é uma transformação do olhar. Não tem jeito de uma pessoa passar por aqui sem parar para contemplar. Pensar um pouco a respeito disso tudo”, conta. “Às vezes, fico parada olhando as pessoas passar e noto que tem gente que entra por uma porta e sai em seguida pela da frente. É engraçado, mas mesmo essas ficam intrigadas com o que vêem.”
Laura Vinci teve liberdade para ocupar os três andares do prédio com criações feitas especialmente para o CCBB. Ela começa o passeio pelo subsolo. Cento e quatro letras congeladas dão a volta no cofre, despertando uma sensação de atenção e estado de alerta no espectador. “Fiz o texto quase todo de uma vez. Tinha uma idéia do espaço e não é que coube direitinho o que eu queria dizer”, conta.
Um pó estranho, de densidade muito baixa, enche o cofre. “Descobri uma espécie de resíduo de calcário que funcionava melhor que o pó de mármore.” Foi inusitado.
Mas na verdade a viagem começa logo no hall do térreo, com bacias de vidro transparente cheias de água ligadas a uma resistência elétrica. “Vapor. Muito vapor. Durante todo o tempo que o CCBB ficar aberto para visitação, a água vai ficar entrando em estado gasoso.”
Lance de escadas --ou elevador, se o visitante preferir-- e paramos no terceiro andar. Uma sala branca é ocupada por pedras moldadas de mármore branco e pó branco. É de uma brancura que cega. “Só aqui o olhar do espectador realmente sente um baque. Tem de fechar um pouco as pupilas e acaba mudando sua visão da obra.”
Parecidas com as obras que Vinci expôs na então galeria Camargo Vilaça (hoje Fortes Vilaça), as esculturas são sinuosas e têm uma idéia de leveza. Falsa idéia. São blocos bem sólidos. “São uma resposta ao que fiz naquela exposição. As esculturas eram convexas, agora são côncavas”, afirma.
Para ela, o convite vai resultar numa ampliação do público das artes plásticas. “Uma galeria não tem a visitação daqui, que chega a mil pessoas por dia. E o mais interessante é que é gente de todo o tipo. O Centro é uma coisa viva. Não existe isso de revitalização. O que ele merece é uma apropriação de espaço pela arte”, completa. (03/03/2002)
Serviço:
Centro Cultural Banco do Brasil (R. Álvares Penteado, 112, tel. 3113-3651/3113.3652).
Quando: a partir de 3 de março, das 12h às 18h30, até 7 de abril.
Entrada franca.