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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

06/12/2025 28.81 ºC, São Paulo

Mico no meio da peruada

O grupo nova iorquino de rap Beastie Boys uma vez cantou "You've got to fight for your right to party" (Você tem que lutar pelo seu direito de se divertir/fazer festa). Concordo com tudo o que foi dito, mas acrescento um ponto: este direito termina a partir do momento que você está atrapalhando outra pessoa. Não entendeu nada? Explico.

Sexta-feira, 19 de outubro de 2001, estava eu dirigindo pelo centro de São Paulo. Meu destino seria a rua Martins Fontes, ao lado do Diário Popular. O verbo foi usado no futuro do pretérito porque eu gastei duas horas e meia parado no trânsito, a exatos três quarteirões do meu destino final. No começo imaginei que fosse algo normal para a região, rica em transportes coletivos, mas complicada para quem está de carro. Após 10 minutos sem sair do lugar e sob um inesperado sol forte, não era difícil perceber que algo estava errado. Começavam então a surgir os boatos para a tal paralisação. Os motoristas de táxi que estavam por perto logo repetiam a informação de que estava acontecendo uma manifestação, um piquete. Neste momento, passou atrás do meu carro um "ser" trajando um vestido malhado trançando as pernas de tão bêbado. Só fui entender que aquilo não era um ato isolado quando um afeminado Barney Rubble (sim, o amigo inseparável do Fred Flintstone!) passou na minha frente também alcoolizado, esbravejando contra todo mundo e sendo guiado pelo Super-Homem(?!). Alguns minutos depois começou a tocar Anna Júlia, a balada do Los Hermanos, em um trio elétrico na frente do Mappin. Não tinha mais dúvidas, estava no meio de uma micareta, os tradicionais carnavais fora de época. O taxista, que àquela altura já havia se tornado meu amigo, não parava de falar. Ele me contou que o rádio relatava a tal paralisação e dizia que o trânsito no local estava lento. Lento??? Eu estava parado no mesmo lugar havia 40 minutos!!! Estacionei o carro na frente do ponto de táxi, em cima da faixa de pedestres, subi a janela, tranquei e fui dar uma volta, comprar uma água. Quando voltei, os meus “companheiros” já não estavam mais lá. O trânsito voltara a andar (devagar, não vou mentir). Chegando mais perto do Teatro Municipal, vi policiais, mecânicos, índios e os outros caras do Village People. Perguntei para uma típica holandesa o que estava acontecendo e ela esclareceu tudo: Peruada. Ao lado do "Pindura", a "peruada" é a mais tradicional festa da Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Vasculhando pela Internet, consegui descobrir apenas que ninguém sabe ao certo quando tudo começou. Mas a sua origem remonta aos dias de um Brasil ainda imperial em que alguns alunos roubaram perus de um professor da faculdade e tiveram a cara-de-pau de convidá-lo para o jantar em que as aves foram o prato principal. Enquando o desavisado mestre enchia a pança, os pupilos não conseguiam parar de rir. A farra se tornou então uma tradição anual. História bonita, engraçada e curiosa, mas o que eu tenho a ver com isso? O que o meu amigo taxista que estava atrasado para levar a esposa ao médico tinha feito para merecer aquele trânsito? Quando cheguei em casa, um amigo do meu irmão que será advogado daqui a alguns anos me contou com um sorriso no rosto que estava lá no meio da peruada. Que a "balada estava ótima. Parecia Salvador!". Segundo ele, o Centro Acadêmico XI de Agosto gastou R$ 40 mil na festa. Que bom que eles têm todo este dinheiro e que o estão usando para a felicidade dos colegas de curso! Só peço uma coisa: nos próximos anos, façam DIREITO e não atrapalhem as outras pessoas. (26/10/2001) Marcelo Forlani - Editor do site Omelete

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