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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

06/12/2025 25.35 ºC, São Paulo

Mate de maçã na mão e crônicas na cabeça

Por Lígia Nogueira O cheiro do Copan me vicia. Não sei se é porque sigo toda vez o mesmo ritual de passar pela entrada do Bloco D, e acabo dando de cara com o Café Floresta. O movimento daquela gente, e o cheiro, juntos, desenham lembranças na minha cabeça. Vontade de voltar sempre. Quem sabe um dia voltar com todas as minhas coisas para cá? No meio do caminho, um mate. Chá mate na mão e uma crônica na cabeça. Esse dia foi especial: revistei lugares por onde não passava havia algum tempo. Tinha de achar a banca de jornais do seu Mário Abateppaulo, “fica perto do Bar Brahma”, ele me dizia. Uma da tarde, Ipiranga com São João. E qual dessas é a famosa banca? Eram tantas ao redor que resolvi seguir um método: começar pela mais próxima do bar e ir aumentando o raio de atuação. Câmera digital em punho, arrisquei uma palavrinha com o jornaleiro antes do primeiro clique. “Espera aí, eu conheço você. Você passou aqui outro dia, fotografando. Olha, vocês vêm aqui e apunhalam a gente pelas costas. Vocês, da prefeitura, não têm jeito mesmo.” E o vendedor de jornais falava mais alto que as minhas (fracas) tentativas de explicação, enquanto ele tirava umas revistas e jornais que estavam em uma pequena bancada na calçada – o motivo para fugir dos fiscais. E continuava gritando – e cuspindo – e vindo na minha direção. Eu nunca tinha trocado um só olhar com ele antes. “Não. Era você, sim, tenho certeza. Estou reconhecendo você por causa dos seus dentes.” Eu tentava explicar que não tinha estado ali nas últimas semanas. E que história era aquela de dentes??? Inútil. Enquanto ele esbravejava, fui me afastando e olhando em volta. Devia ter mais umas oito bancas iguais àquela num raio de dez metros. “Se os outros forem assim também...” Eu tentava não imaginar. Mas minha teimosia não me deixou ir embora dali com uma interrogação (e a câmera vazia). Depois de alguns contatos – civilizados – com outros jornaleiros, encontrei o que procurava. E acabei conhecendo, por tabela, o seu Léo, uma figura rara, morador do Centro e jornaleiro há mais de 30 anos. Valeu a pena ter insistido. Mas sabe, teria sido bom mesmo se não tivesse encontrado. O Centro sempre vale a pena. (21/10/2001)

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