Copo vazio e solidão nem pensar

Depois de um belo congestionamento – não podia esperar outra coisa, afinal a região da Santa Ifigênia no sábado é uma loucura – finamente cheguei ao Bar do Léo.
“Quem é o funcionário mais antigo daqui?”, pergunto, ávida em busca do personagem da matéria. “O Seu Luiz”, me diz o senhor do caixa, “pode falar com ele, é esse aqui”. Mas o Senhor Luiz, a princípio estava meio relutante. “Você tem que vir aqui durante a semana, hoje já veio gente de jornal pra falar comigo, estudante pra falar comigo... e este movimento todo. Não dá pra conversar”, explica. Só então entendi que o lugar tinha outro ritmo. E resolvi entrar em sintonia.
Olhei em volta, as pessoas estavam em meio ao Centro de São Paulo descontraídas, despreocupadas e desestressadas. Muita gente em pé do lado de dentro e de fora. Encostei no balcão. João Dantas, um dos garçons e principal operador do barril de chopp, me ofereceu um copo só de espuma. O freguês que estava ao meu lado, André Luís Ramos já havia avisado que eles se recusavam a servir chopp sem espuma. “É um creme. Moça, você vai se pedir desculpa de ter chamado isso de espuma”, sentenciou – ele tinha toda razão, diga-se de passagem.
Há três anos trabalhando no Bar, João considera-se um bebê perto dos anos de experiências dos colegas, mas já tem no currículo muitos milhares de chopps servidos. “De quinta a sábado sirvo, em média, 2400 a 2500 copos de chopp por dia”, calcula ele. Peço uma sugestão de lanche, ele me traz um bolinho de bacalhau. Delicioso!
Sem pressa, vou aproveitando os momentos de intervalo entre os pedidos de canapés e lanches para conversar com Seu Luiz – que se mostra uma simpatia. Trinta e nove anos de casa, começou no Bar do Léo em 1962, depois de ter trabalhado nove anos no Salada Paulista – restaurante que existia no Centro, ao lado do antigo Cine Ipiranga. Conheceu o Léo, o fundador. “Ele já deve ter morrido há uns 15 anos. Vendeu o bar porque estava começando a ficar doente”, conta. Hoje o proprietário é Hermes de Rosa.
“Na minha época aproveitei bastante o Centro. Hoje, depois do expediente, vou pra casa. Sou moço comportado”, diz e dá uma piscadela para André, freguês que estava ao meu lado. "Já inventei muitas receitas mas hoje tô aposentado, só vou fazendo o que já existe." Entre suas criações estão o sanduíche Polaco e o canapé Rococó. E esse é meu próximo pedido. Muito saboroso e leve!
As pessoas não param de chegar, o Bar está mais cheio, o balcão mais disputado. “Ih! Hoje ainda está vazio, se o patrão aparece aqui vai ficar nervoso”, comenta João. O ambiente permanece agradável, mas o tempo lá fora prepara uma toró. É hora de ir embora. Ganho de lembrança de Seu Luiz um cartão postal do Bar e as bolachas (de colocar sob o copo). Nelas o emblema é o tradicional leãozinho segurando uma caneca de chopp, apoiado na plaquinha com o nome do Bar, ao lado, os dizeres em alemão “bier über alles” que querem dizer “cerveja acima de tudo”. Um brinde! (31/03/2001)
Serviço
Bar do Léo
Rua Aurora, 100, tel, 221-0247
Aberto de segunda a sexta, das 11h às 18h e nos sábados das 11h às 16h. Fechado nos domingos e feriados.
Próximo ao Metrô Luz