Inglesa de cem anos procura restaurador

A Estação da Luz foi inaugurada em março de 1901 e servia para agilizar o escoamento da produção de café que vinha do Oeste Paulista e que tinha que sair pelo Rio de Janeiro. Cem anos depois, parece que as estruturas planejadas pelo inglês Charles Henry Driver e erguidas exclusivamente somente sobre material vindo da Grã-Bretanha não está muito bem. Notas na imprensa alertam para o invisível perigo de desabamento de algumas partes.
"Que desabar que nada! Devia desabar cliente pra gente aqui", reclama o engraxate Flávio (o nome está na aba de seu boné vermelho), de 69 anos. Ele, que hoje lustra cerca de oito pares de sapatos por dia, já chegou a engraxar 30 em um só dia. "Até a década de 70, muita gente usava sapato, era difícil ver alguém de tênis. Depois que o jeans entrou na moda, o povo começou a usar tênis - porque sapato social não combina -e o movimento caiu bastante", diz.
Seu Flávio começou a engraxar em 1940, quando ainda morava em sua cidade natal, Conchas (interior de SP). Logo depois, começou a trabalhar em uma olaria, onde ficou por sete anos. "Meu cunhado foi até a minha casa pedir a mão da minha irmã em casamento e me convenceu de que vir para a capital seria uma boa, eu poderia me dar bem como engraxate, ele gostava muito do meu trabalho",conta Flávio, que trabalhou um tempo em uma olaria, na Vila Maria, que acabou falindo e finalmente começou a profissão de engraxate pra valer, na Estação Roosevelt (que hoje faz integração com o metrô Brás). "Engraxando, ganhava o dobro do meu salário na olaria."
Hoje ele mora na Água Funda com seus dois filhos: Flávio, de 23 anos, e Wagner, de 22, que são auxiliares de escritório. Só não sabe até quando vai ficar na sua cadeira de engraxate. "Dizem que vão reformar aqui esta parte e a gente vai ser obrigado a sair. Não sei para onde a gente vai, mas provavelmente para as redondezas, por causa dos nossos fregueses", explica. (16/03/2001)