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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

06/12/2025 26.28 ºC, São Paulo

Bordado arquitetônico

Que tal resumir a história de São Paulo em 78 páginas num livrinho em formato de bolso? Parece difícil? Imagine fazer essa empreitada em apenas três semanas. Foi o que a arquiteta e urbanista Raquel Rolnik fez para produzir o volume “São Paulo” da coleção Folha Explica. Em 20 dias, contados a partir da sugestão do organizador da coleção, Arthur Nestrovski, estava pronta a nova edição. “Eu já tinha tudo pronto de tantas aulas e palestras que dei sobre o assunto. Só precisava tirar da minha cabeça e organizar em papel”, conta. “O bom é que consegui condensar a história da formação da cidade, em uma linguagem fácil e acessível ao leigo, sem ficar chato para o especialista.” A obra ultrapassa as barreiras romântica da capital paulistana. Fala igualmente da época do bonde até o aumento da violência e da poluição em vigor na megalópole. “Foi proposital para mostrar que a atual conjuntura de São Paulo foi definida por escolhas admistrativas e políticas. Quando foi priorizado o ônibus em vez da linha do trem, criou-se uma nova realidade. Da mesma forma aconteceu quando se escolheu expulsar os pobres para a periferia”, diz a autora. O livro ajuda a desmistificar algumas “verdades” na formação de São Paulo. Por exemplo, sabe qual o Estado com maior migração para a capital, fora os interioranos? “Minas Gerais”, responde Raquel. “É impressionante, mas Pernambuco e Bahia perdem feio para os mineiros.” A vinda dos estrangeiros é outro mito. "Não houve uma década de imigração por excelência. Aqui em São Paulo, até hoje, são cerca de 300 mil pessoas entrando. Proporcionalmente, a porcentagem não é muito alta, mas, em números absolutos, quer dizer que eles nunca deixaram de chegar ao país.” E o Centro nisso tudo? “O Centro é onde a nossa história começou. É o lugar mais lindo de São Paulo. Eu adoro o Centro. Condensa todas as camadas da sociedade paulista, e até o abandono pelas elites.” Mas Raquel não vê apenas as glórias da região central. “Precisamos rehabilitar o Centro. Reconquistá-lo. Em vez de exportar os pobres, é hora de fazer um projeto específico para integrá-los ao Centro”, afirma. E mais ainda: “O Centro merece uma valorização tanto patrimonial como imobiliária. É possível voltar a pensar o Centro como uma região nobre. Faltava querer. Agora, com o governo da Marta, teremos a vontade de mudar também”. Para Raquel, o que se vê hoje são duas origens de revitalização. Uma vinda das associações públicas, como o Viva o Centro, e outra das associações de moradia, reivindicando o “voltar a morar no Centro”.“E tenho certeza de que a moradia popular é compatível com o processo de revitalização. Falta apenas um projeto que viabilize isso para que tenha uma arquitetura de qualidade. Não seja um monte de casinhas iguais sem infra-estrutura nem planejamento”, diz. E completa: “O Centro é muito grande. Não pode ser pensado como um grande bloco. Cada pedacinho é importante e precisa ser estudado. Como isso não é de agora, muito já foi feito. Agora é um trabalho de bordado. Como uma colcha de retalhos, cada pedaço de pano precisa ser costurado com cuidado para um bom resultado final. Não é fácil mesmo, mas é possível." (10/03/2001)

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