O homem que faz a cabeça

Duas tranças compridas, de 45 centímetros cada, cabelos castanhos e ondulados. Índio, o Rei do Cabelo, faz a oferta e diz que paga 50 reais por tudo. “O dia inteiro eu recebo pessoas oferecendo cabelo desse tipo, muito ralo. O melhor cabelo é aquele de 60 centímetros e encaracolado, pois não é preciso fazer permanente”, explica.
A loja de Derli, mais conhecido como Índio, fica na Galeria do Rock (Rua 24 de maio, 62), número 268. O proprietário importa e exporta cabelo, principalmente os naturais, há dez anos. Além da compra e venda de cabelos, Derli cria as perucas expostas em sua loja, um processo que requer cuidado e paciência. "O primeiro passo é limpar o cabelo, escovando o chumaço em mãos para ficar com a melhor parte do material. Depois é preciso ferver esse cabelo com água e xampu, para matar as lêndias e piolhos. Mas, só vai dar certo se a quantia de cabelo for muita", conta.
A prática de criar perucas e a especialidade em compra e venda de cabelos foi aprendida com uma mulher no Rio Grande do Sul, em Ibirubá. "Lá no Sul, eu era lavrador, do mesmo jeito que a minha família continua até hoje, como a tradição manda. Da vida do Sul ainda tomo chimarrão, gosto de uma boa costela mal passada e sou gremista".
Derli Rodrigues de Jesus tem 36 anos e está em São Paulo desde os 18. Foi já nesta idade que viu seus negócios de cabelos e perucas começarem a expandir. "A matriz da empresa é essa aqui em São Paulo, mas tenho mais três filiais, em Florianópolis, Campo Grande e Porto Alegre."
O visual da loja não pode ser chamado de sofisticado, mas apesar da aparência despojada, a experiência de Índio no ramo, já chamou a atenção de artistas e da televisão. "A Renata, do Axé Blonde (grupo de dançarinas de axé music) já veio aqui comprar perucas. Outras pessoas famosas também compram aqui, mas não posso contar quem são. O Luciano Huck esteve aqui há uns cinco meses fazendo reportagem para o programa dele", gaba-se. "Mas, sabe, as pessoas com problema de câncer, às vezes, aparecem. Aqueles que fazem quimioterapia, entende, né?"
O especialista em cabelos viaja todo ano pelo Brasil inteiro à procura de materiais diferentes e de qualidade. Já percorreu o Nordeste, a região do Mato Grosso e o Sul. "Os melhores cabelos estão no Sul. Lá encontro loiros com facilidade, cabelos fortes e cuidados. Eu pago mais pelos loiros. No Nordeste a coisa muda, os cabelos são fraquinhos e ralos. E olha que eu sei do que estou falando, já viajei muito pelo Brasil", comenta.
Índio gosta de São Paulo, em especial do Centro, onde mora desde que chegou à capital. "Esta cidade é boa para o trabalho, mas o lazer mesmo fica no interior, no meu sítio perto do Paraná. Aqui em São Paulo, gosto de passear na Praça da República e na Sé . O Centro é um lugar onde se encontra de tudo e tudo está na sua mão, a dois passos de você".
Mesmo sem saber direito o que é Internet e onde fica um site, o faro comercial do gaúcho não deixou escapar a pergunta que estava na ponta da língua: "Essa matéria vai sair no seu site, né? Preciso ver esse negócio de sampacentro para ver se me interesso e coloco uma publicidade nele, o que você acha? Poderia ficar assim, Índio, o Rei do Cabelo, não existe pessoa que tenha comprado mais cabelo do que eu, gostou?" (12/01/2001)