Balão Mágico

Eram 21h30. Tinha marcado com o Samuca às 21h. Ele estava atrasado. Pedi uma mesa e um chope claro, claro.
O Café Balloon estava lotado. Nenhum lugar para sentar. O garçom ofereceu uma mesa ao lado de dois "senhores respeitáveis". Mais tarde descobri: se chamavam Washington e Álvaro. Os dois trabalhavam em empresas de aviação. Recentemente tinham virado concorrentes, mas eram amigos há mais de 25 anos. Quem podia concorrer com isso?
Juntei minha mesa com a deles e fiquei ouvindo histórias: de músicas, de poetas, de rodas de amigos, de mesas de bar, de boemia (a que me tens de regressso?). Uma hora se passou e nada de Samuca chegar. Achei que já era tarde e me entreguei à conversa alheia (que melhor prato a um jornalista?).
"Você quer que eu te conte uma canção que marcou a MINHA história", dizia, sem esperar confirmação. E emendava Ataulfo Alves, Chico Buarque de Hollanda, Lupcínio Rodrigues, Maysa... "Estamos sempre aqui. Não temos mesa fixa, mas todo dia é para cá que vamos nos encontrar para bater um papo. Pergunte por Alvarão ou Washington, Serginho ou Souzinha. Vai ter sempre uma mesa reservada para um de nós", completa Washington, enquanto assiste seu time fazer mais um gol.
Já passa de mais de uma hora e meia de bate-papo quando me apontam para o Samuca chegando. "Tinha me esquecido, mas ele está te esperando", diz Juvenal, um dos garçons do bar.
A mesa fica em silêncio, enquanto chamo o cantor para a mesa em que estou sentada. A dupla de contadores de histórias meio que reconhece o companheiro de bar e fica calada, esperando que ele se manifeste. No "boa noite", voltam a falar de orquestra, de um disco recém-lançado e que querem que ele toque. Samuca diz, tímido, que só na sexta, "para não atrapalhar quem está tocando".
Se você estiver passando, vá na terça ou sexta. O público acompanha com palmas ou pedindo músicas. E o Samuca delira: "O melhor para um cantor da noite é que peçam músicas. Quando a platéia aplaude ou bate o pé acompanhando uma música, já me sinto o rei do pedaço".
"Faz quase 15 meses que eu toco aqui e não há nenhum cantor que me peçam mais do que Djavan. Ele é o show dos cantores noturnos", continua Samuca.
E a paixão pelo Centro parece contagiar: "É algo que não dá para notar. Um cara pode ser grosso, o outro, machista, mas você torce para que as pessoas se esqueçam de tudo e embarquem na sua música. É como eu penso que deve ser o Centro. Não há nada mais lindo", conta.
Durante a estadia das garotas do Sampacentro no Copan, pedimos para assistir à premiação do Oscar 2000 no Café Balloon. Samuca tocava (era domingo) e ouvimos dele um singelo: "Eu concordo, também quero ver, mas preciso tocar, me contrataram para isso". Foi o prêmio de melhor música de fundo por muito tempo. "Espero estar aqui sempre. A menos que me chamem para tocar no Japão ou na França", diz Samuca. Álavaro logo interrompe: "Japão não, porque é roubada, mas, se for na França, vá, porque eu estou lá bastante e posso te ouvir tocar".
E, para fechar um poema de bar: "Juvenal, onde quer que você esteja, me traga sempre uma cerveja!". (21/12/2000)
Serviço:
Café Balloon
Happy hour e música ao vivo todos os dias a partir das 18h
Serve café da manhã e almoço e conta com delivery
Av. Ipiranga, 200 (Edifício Copan), tel. (11) 258.7759
Próximo ao Metrô República