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Para reviver um pouquinho do Centro visto pelos seus personagens.

06/12/2025 26.28 ºC, São Paulo

A radical busca por Deus

São quase 10h da manhã quando soa o primeiro sino da missa do Mosteiro de São Bento. Quando o relógio marcar 10h em ponto, o sino será tocado novamente. Irmão Afonso explica que é uma tradição medieval. "Naquele tempo, os monges trabalhavam longe dos mosteiros e não tinham relógio. O primeiro sino era o aviso que a missa estava para começar e eles tinham tempo de sair de onde estavam para chegar a tempo. O segundo sino marcava o início oficial."

Afonso Maria Lima Correia cumpre o rigoroso expediente do Mosteiro de São Bento há quatro anos. Acorda às 5h, veste a batina negra e não pronuncia uma palavra até 6h45. A essa hora, ele já fez as orações matinais e tomou café da manhã junto com os outros membros do mosteiro. Às 7h acontece a missa conventual (um ofício canônico aberto ao público e com todos os membros obrigatoriamente presentes) e, às 8h, cada um segue para as aulas ou trabalhos administrativos. O dia segue dessa maneira, com aulas e trabalho alternados com orações, ofícios canônicos e refeições silenciosas, todos realizados pontualmente. Às 20h, os monges se recolhem. Irmão Afonso tem diversas obrigações na instituição. "Sou mestre-de-cerimônias, hospedeiro (aquele que recebe hóspedes e visitantes) e bibliotecário", diz, acrescentando que a biblioteca conta com 80 mil títulos sobre história geral, história eclesiástica, filosofia, biologia, medicina, literatura, entre outros assuntos. "Também faço parte da comissão que seleciona novos candidatos." O religioso tem aulas de latim, grego e aramaico. "O latim é obrigatório para todos. Também temos que aprender inglês ou francês. Quando tiver um tempo livre, vou optar pelo francês, pois além de ser o idioma de boa parte dos livros que temos que ler, acho que é mais culto que o inglês." As missas beneditinas são famosas pelo canto gregoriano. Irmão Afonso garante que não há a necessidade de um estudo mais aprofundado para poder entoar os cantos. "Eu mesmo aprendi de ouvido, acompanhando os outros monges. Há aulas de canto para quem quiser, mas, no meu caso, não achei necessário." Nem só de obrigações vive um monge. Aos sábados, Afonso e outros religiosos tomam um microônibus para Itanhaém (litoral sul de São Paulo) ou para Itu (interior do Estado), onde o mosteiro mantém casas para finais de semana. "Lá fazemos passeios, assistimos a filmes, conversamos bastante e descansamos", conta o religioso, que elegeu "...E o vento levou" como seu filme preferido. "Durante esses passeios os ofícios canônicos não são deixados de lado, mas realizam-se em horários adaptados", revela. Irmão Afonso sempre gostou dos rituais católicos e aos 15 anos mostrou seu interesse pela vida religiosa, tornando-se coroinha da Basílica da Sé. Aos 18, ingressou para o mosteiro, já sabendo que teria que cumprir uma exigente rotina. tanto que não permitiu que tirasse uma foto sua para esse trabalho. "É melhor você tirar uma foto de todos os monges, não só de um." Mas não teve grandes dificuldades para se adaptar. O mais difícil mesmo foi convencer a família, que preferia que ele tivesse seguido uma carreira "mundana". "Vim buscar a Deus. Há diversas maneiras de fazer isso. A vida monástica é uma busca mais radical."

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